Agência Primaz-Ano 6

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Hoje é sexta-feira, 26 de abril de 2024

Saneouro perde na Justiça e não pode cobrar água pelo consumo em Ouro Preto

A empresa ainda precisa comprovar o atingimento de 90% da hidrometração para iniciar a cobrança real da tarifa de água

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Concessionária tenta iniciar a cobrança de água pelo consumo em Ouro Preto, desde o final de 2021 - Foto: Divulgação/Saneouro

A Juíza Kellen Cristini de Sales e Souza, da 2ª Vara Cível da Comarca de Ouro Preto, indeferiu, nessa segunda-feira (25), o pedido de tutela antecipada requerido pela Saneouro para cobrar a conta de água pelo volume consumido. A defesa apresentada pelo Município constatou advertências legais e mostrou que a concessionária só poderá iniciar a cobrança real da tarifa quando comprovar o cumprimento da meta de 90% da cidade hidrometrada.

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Em seu pedido de tutela antecipada, a Saneouro alegou que, como atual concessionária de água potável e esgotamento sanitário e Ouro Preto, em razão do contrato de concessão firmado em 16 de outubro de 2019, pelo prazo de 35 anos, não tem medido esforços para executar com máxima excelência os serviços que lhe foram concedidos, tendo alocado R$ 87 milhões em bens à concessão para atingir as metas contratuais e aumentos de índices de atendimento e qualidade dos serviços de água e esgoto. 

A Saneouro alegou ainda que superou as metas contratuais e que teria a auditoria da Agência Reguladora Intermunicipal de Saneamento Básico de Minas Gerais (ARISB-MG) atestando tais marcas, incluindo o atingimento de 90% da hidrometração na cidade

Por outro lado, de acordo com o pedido de tutela antecipada da Saneouro, Ouro Preto teria a intenção de rescindir o contrato, com aplicação de penalidades à concessionária, caso fosse iniciada a cobrança da tarifa de água com base no consumo real.

Posição do Município

A Juíza Kellen Cristini determinou a intimação das partes para se manifestarem sobre a ação. O Município de Ouro Preto manifestou-se na terça-feira (19), afirmando haver prejudicialidade entre os processos supracitados. A Prefeitura Municipal, por meio de sua Procuradoria-Geral, alega a ausência de interesse processual e o não preenchimento dos requisitos da tutela de urgência.

O Município de Ouro Preto alegou que a declaração de rescisão contratual deve ser obrigatoriamente precedida de Processo Administrativo, que conclua pelo cometimento de infração contratual. Assim, a concessionária está sujeita ao regime jurídico de direito público.

A Saneouro, por sua vez, sustenta que o Município de Ouro Preto se contradiz, apresentando o Parecer Jurídico n° 019/2022, no qual há a advertência de punição contra a autora, antes de instaurar o processo administrativo, que visaria apurar o descumprimento do contrato administrativo e, posteriormente, a necessidade de aplicação de multa.

Entretanto, para a concessão da tutela de urgência, seria necessária a presença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo do dano ou o risco ao resultado útil ao processo. A probabilidade do direito, a ser comprovada pela Saneouro, consubstancia-se no abuso de poder do Município de Ouro Preto em coibir a cobrança de tarifa de água pelo consumo real, embora esta tenha atingido a meta de 90% de hidrometração.

A concessionária alega que atingiu a meta com os 1.800 hidrômetros que eram de responsabilidade do Serviço Municipal de Água e Esgoto (SEMAE), sendo que esses hidrômetros devem ser considerados para fins do cômputo dos 90% das ligações hidrometradas.

O Município de Ouro Preto argumenta que as metas não foram cumpridas, conforme, Parecer Jurídico 019/2022, mas não se opõe à tarifação, desde que seja comprovado que a empresa cumpriu, efetivamente, suas obrigações contratuais no que se refere à hidrometração de 90% das ligações de água ativas na cidade. Sustenta que a meta somente seria cumprida, segundo a agência reguladora, se for retirado do cálculo o número de ligações não hidrometradas pela SEMAE. Mas ainda existe dúvida quanto ao número total de ligações de água ativas existentes na cidade.

No Parecer Jurídico 019/2022, o Município de Ouro Preto, atento ao princípio da vinculação, sustenta que a concessionária somente poderia iniciar a cobrança pelo efetivo consumo da população após a hidrometração de, pelo menos, 27 mil usuários, baseado no termo do Edital. Narra que, na proposta licitatória, a empresa apresentou uma previsão de hidrometrar 28.236 ligações de água. Já no ofício 413/2021, a Saneouro informou que a quantidade de ligações de água em setembro de 2021 era de 24.885. No ofício 156/2022, de maio de 2022, a empresa informou que, após levantamentos, chegou-se à conclusão de que há 23.868 ligações ativas na Cidade Patrimônio, mas hidrometrou apenas 20.493 usuários, o que corresponde a 85,8% das ligações ativas.

Com isso, a Procuradoria-Geral de Ouro Preto afirma que a empresa concessionária alega que a SEMAE deveria ter hidrometrado 1.800 ligações ativas, mas só realizou 468, querendo excluir da sua obrigação a hidrometração de 1.332 usuários para atingir a meta contratual. Assim, o Município considera que a concessionária não atingiu o percentual mínimo do contrato a fim de autorizar a efetiva cobrança pelo consumo populacional, razão pela qual posicionou-se pelo não acolhimento da pretensão exposta nos ofícios 156/2022 e 182/2022, mantendo a cobrança de Tarifa Básica Operacional (TBO), como vem ocorrendo, até que, efetivamente, se comprove a hidrometração de, no mínimo, 90% dos usuários, sob pena de rescisão do instrumento contratual e aplicação das penalidades cabíveis.

O Município de Ouro Preto, a fim de resguardar os direitos da coletividade, tendo em vista o princípio da supremacia do interesse público, apenas notificou a autora (Saneouro) acerca da impossibilidade de cobrança da tarifa por uso real, em razão do não cumprimento da meta. Nessa linha de raciocínio, em princípio, não se depreende que o Município pretenda, de imediato, a rescisão do contrato ou a aplicação de multa, uma vez que tais condutas demandariam a instauração de processo administrativo, mas apenas cientificou a concessionária, ora autora, de que a meta não foi cumprida e, por isso, a tarifação por uso real ainda não seria possível. Dessa forma, caso a concessionária comece a cobrar tarifa diferente da TBO, seriam aplicadas as penalidades após a instauração de processo administrativo”, considerou a Juíza Kellen Cristini, em sua decisão.

Para a Juíza, não cabe ao Poder Judiciário imiscuir-se nas questões referentes ao cumprimento da meta de hidrometração de 90% dos usuários. Entretanto, além da rescisão para resguardar o interesse público, o descumprimento das obrigações, pela concessionária, pode ser causa de rescisão do contrato. Para que a concessão seja rescindida, no entanto, a Saneouro precisa ser comunicada de seu descumprimento e é preciso que haja a recomendação de ser sanada a irregularidade em um prazo determinado. Somente após esse tempo que o concedente poderá instaurar um processo administrativo, assegurando a ampla defesa da empresa. Se for constatada a inadimplência deste, o concedente declarará a caducidade. 

A juíza considerou, de forma preliminar a nossa manifestação coerente, assim como o nosso parecer Jurídico 19/2022. Agora aguardamos a instrução do processo. O Município será citado para apresentar contestação e a nossa linha será sempre no sentido da empresa cumprir com as suas obrigações que são previstas no contrato e o Município fiscalizará essas ações”, declarou o procurador-geral da Prefeitura de Ouro Preto, Diogo Ribeiro, à Agência Primaz

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Decisão

Após a análise dos documentos, a Juíza Kellen Cristini constatou que a Prefeitura de Ouro Preto comunicou a concessionária sobre o descumprimento, todavia, não fixou prazo para ser sanada a irregularidade. Dessa forma, não há previsão para a instauração do processo administrativo, exigindo o Município apenas o cumprimento da meta de hidrometração de 90% dos usuários.

Em conclusão, não há ameaça de rescisão do contrato ou de aplicação de penalidades do Município de Ouro Preto à autora, eis que, diante das provas colacionadas, houve apenas notificação do não cumprimento das obrigações contratuais, na qual o réu deixa claro que, caso se mantenha o descumprimento contratual e a autora passe a proceder à tarifação por uso real, haverá aplicação das penas previstas em lei e no contrato, obviamente, precedidas de um processo administrativo”, consta na decisão da Juíza. 

Por tudo isso, a Juíza Kellen Cristini indeferiu a antecipação de tutela pedida pela Saneouro. Ela também entende que só pode ser declarada a extinção do contrato de concessão pela caducidade, com a imposição das penalidades, após o devido processo administrativo.

A Agência Primaz entrou em contato com a Saneouro para saber qual o posicionamento da empresa quanto à decisão e quais seriam os próximos passos da concessionária para conseguir iniciar a cobrança de água pelo consumo na cidade. Como resposta, a empresa disse: “O assunto está analisado pelo departamento jurídico do grupo“.

Hidrometração

A Saneouro possui vários obstáculos para conseguir iniciar a cobrança de água pelo consumo em Ouro Preto, um deles é a reprovação popular sobre os serviços da empresa na cidade. Muitos moradores não permitiram que a concessionária instalasse hidrômetros em suas casas, por exemplo, o que dificultou o atingimento de 90% do município hidrometrado. 

Como solução, a empresa utiliza um artifício previsto no contrato de cortar o fornecimento de água para aqueles que não permitiram a instalação do hidrômetro nas suas casas. Os usuários têm 48h para solicitar à concessionária o agendamento da instalação do instrumento.

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