Blonde: um longa perigoso demais sobre a vida de Marilyn Monroe
Cinebiografia de uma das maiores estrelas de Hollywood é mais uma tentativa — dessa vez bem falha — de humanizar e vitimizar grandes ídolos da cultura estadunidense.
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Marilyn Monroe é um dos rostos mais conhecidos do planeta. A atriz fez enorme sucesso no século XX, mas não sem sofrer no círculo abusivo dos EUA daquele tempo. É com esse olhar que Blonde mostra a vida de Norma Jean Mortenson, da infância à morte.
Vivida por Ana de Armas, Marilyn é mostrada como uma dura vida de quem não conquistou nada sem sofrer bem. Seja nas mãos de sua mãe, com problemas mentais, pela falta de pai ou pelos inúmeros homens que passaram em sua vida.
Ainda que esse sofrimento humanize a figura de Marilyn, há um problema claro de como o diretor Andrew Dominik reforça a objetificação de Monroe. Não só as cenas de nudez mostram isso, mas a atriz é sempre vista de maneira infantilizada, uma espécie de Lolita meio tola, meio ingênua e nunca dona de suas ações.
A biografia de Marilyn, por mais enviesada que uma obra assim possa ser, sempre deu conta que a atriz era uma exímia estudiosa de suas personagens e dona de si, de maneira que suas ações e escolhas pudessem a transformar em um ícone pop imortal.
Não que o filme minta em dizer que Marilyn tenha, de fato, sofrido abusos — entre eles estupros —, mas o foco quase total em uma mulher ora frágil, ora ingênua demais, com voz calma e doce, e extremamente sensualizada, mostra que o longa falha miseravelmente em humanizar alguém que já foi alçada para o panteão de deuses.
Esse movimento tem parecido ser frequente em Hollywood. Em 2022, outras obras pareceram fazer com que grandes nomes da cultura dos EUA se mostrassem mais frágeis e vítimas de outros do que os monstros sagrados que a história mostrou.
Caso de Elvis, cinebiografia do cantor que mostra um jovem refém de um empresário que é vítima de grandes expectativas da sociedade.
Elvis e Blonde se assemelham em “humanizar” seus personagens, mas se distanciam na forma como mostram cada um. É claro que o do cantor mostra um sujeito mais ciente de seu papel, enquanto o da atriz se revela um filme interessado em explorar a objetivação de Monroe, tal como no século XX, mesmo que já estejamos na terceira década do século XXI.
Blonde não é de todo dispensável. A atuação de De Armas assegura todos os louros que a atriz tem ganhado nos últimos anos, em especial após Entre Facas e Segredos. Há um certo verniz conceitual na montagem e na fotografia do filme, que fazem com que o mais interessado em linguagem cinematográfica analise cada escolha de tamanho de quadro às variações entre cor e preto e branco das cenas.
Mas que, por fim, mostram-se vazios.
Há quem interessar conhecer melhor a vida de um dos maiores rostos da história da cultura pop, pode ver em Blonde um meio perigoso de fazer isso. Monroe, com certeza, foi muito mais do que um belo corpo e uma pessoa sensual. Há uma genialidade que pouco se vê no filme da Netflix.


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