- Mariana, Ouro Preto ou Itabirito
Mostra “Desvia” reinventa Ouro Preto no olhar coletivo
Em sua 19ª edição, o Coletivo Olho de Vidro ocupa a Casa dos Contos com trabalhos que propõe novos modos e ver, desver e desviar Ouro Preto

Na última quarta-feira (10), o Salão de Exposições da Casa dos Contos recebeu a abertura da mostra “Desvia”, organizada pelo Coletivo Olho de Vidro. Em sua 19ª edição, a exposição permanece em cartaz até o dia 28 de setembro e apresenta trabalhos dos fotógrafos Alexandre Martins, César Tropia, Eduardo Tropia e Milla Damasceno, além do convidado Alisson Lessa, de Lavras Novas.
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O tema deste ano parte da provocação de Manoel de Barros sobre o ato de “desviar” e “desver”. A proposta foi traduzida em diferentes linguagens visuais: da fotografia analógica em preto e branco à mistura entre pintura e imagem, passando por jogos de reflexo e intervenções com espelhos. A montagem segue uma disposição que favorece o contraste, os trabalhos em preto e branco à frente, os coloridos mais ao fundo e, na parede final, o projeto do artista convidado.
Realizada pela terceira vez consecutiva na Casa dos Contos, a mostra reafirma o espaço como casa de experimentação do coletivo, que há quase duas décadas propõe reflexões sobre Ouro Preto e sobre a fotografia contemporânea.
Uma cidade atravessada por desvios
A escolha do tema “Desvia” dialoga diretamente com Ouro Preto, cidade de ladeiras, curvas e perspectivas inesperadas. Para os fotógrafos, cada esquina se transforma em possibilidade estética. O resultado são obras que não apenas registram a paisagem, mas reinventam em novos ângulos, luzes e texturas.
A diversidade de propostas expostas confirma o espírito do coletivo: trabalhar de forma independente, sem que um artista saiba o que o outro está produzindo. Essa dinâmica reforça a surpresa no momento da montagem e valoriza a multiplicidade de olhares.
Além da fotografia, o evento contou também com a participação do projeto Urban Sketchers Inconfidentes, coordenado pelo arquiteto André Perdigão, que trouxe desenhos e aquarelas produzidas por moradores e crianças de Ouro Preto. A iniciativa ampliou o caráter coletivo da exposição, envolvendo a comunidade no processo de criação e representação da cidade.
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Os caminhos de cada olhar em “Desvia”
Na nova edição do Coletivo Olho de Vidro, cada fotógrafo percorreu um caminho próprio para responder ao tema “Desvia”, traduzindo em imagens que se distanciam do óbvio. A mostra, que combina propostas em preto e branco, cores intensas e até pintura, revela como Ouro Preto pode ser lida e reinventada sob diferentes lentes.
Alexandre Martins optou pela fotografia analógica em preto e branco, destacando fragmentos da cidade: paredes, muros, sombras e esquinas que interrompem a paisagem. O resultado são imagens de composições parciais, que convidam o público a enxergar a beleza no que parece incompleto. Como explica o fotógrafo, “qualquer esquina de Ouro Preto já proporciona um desvio”.
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Quem também se voltou para a memória da cidade foi César Tropia, que propôs o tema inicial da exposição. Suas obras inéditas exploram movimentos de câmera e longa exposição, recriando imagens que marcaram sua infância. “Meu pai ia muito a Belo Horizonte, ele tinha um Caravan, com umas janelas atrás mais horizontais e compridas, então minha visão era meio inebriada, quase como esse projeto”, explica. Ao pôr do sol, pontos como a Igreja do Rosário e o Pico do Itacolomi ganham silhuetas quase oníricas, misturando lembrança e experimentação visual.

Em outra direção, Milla Damasceno transforma a experiência do visitante em parte da obra. Suas fotografias desfocadas são acompanhadas por um espelho, de modo que quem observa acaba se vendo refletido e, ao mesmo tempo, desfazendo a nitidez da foto. “É um jogo de ver e desver, em que o público também se torna parte da imagem”, resume a fotógrafa.

Já o convidado Alisson Lessa, de Lavras Novas, trouxe para a mostra um trabalho já concluído, mas que dialoga fortemente com o tema. Suas imagens, de cores intensas e tons amarelados, evocam a ideia de tempo e memória, sugerindo que desviar também é revisitar o passado e trazê-lo de volta em forma de arte.

Por fim, Eduardo Tropia, único participante presente desde a primeira edição do coletivo, surpreendeu ao unir fotografia e pintura. Em sua série, sacadas e perspectivas tradicionais de Ouro Preto aparecem com texturas pictóricas, criando obras híbridas que deslocam o olhar. “Quis experimentar esse desvio, algo que ainda não havia mostrado”, afirma.


Cada trabalho tem sua autonomia, mas, juntos, compõem um mosaico que traduz bem a proposta do coletivo: usar a fotografia como espaço de liberdade criativa e de reinvenção da cidade.
Representatividade: Ouro Preto no olhar de quem vive a cidade

Mais do que contemplar imagens, a mostra provocou nos visitantes um reconhecimento afetivo: ver sua cidade retratada por artistas locais e convidados. Para muitos, a experiência reforçou a importância de Ouro Preto ser valorizada não apenas como cenário turístico, mas como território vivo, interpretado a partir de diferentes subjetividades.
“Eles se superaram nos trabalhos, diz muito sobre a cidade e todo mundo inovou. Vieram com mais garra esse ano e ano que vem vai ser melhor ainda”, afirmou a moradora Maria Auxiliadora, de 78 anos.
Já para a ouropretana Aidê Deloni, de 84 anos, a proximidade das imagens com seu cotidiano foi o que mais chamou atenção, “Gostei muito, tem coisa perto da minha casa. Acho gostoso ver Ouro Preto assim retratado, é lindo demais.”
O coletivo e os próximos passos
Criado em 2006, o Coletivo Olho de Vidro se consolidou como um dos projetos culturais mais duradouros de Ouro Preto. A cada ano, um tema é proposto e desenvolvido de forma independente por seus integrantes, sem hierarquias ou interferências, garantindo autonomia e diversidade de propostas.
Com quase duas décadas de trajetória, o grupo não apenas promove encontros com a arte contemporânea, mas também constrói uma memória visual da cidade. Ao olha para o futuro, a promessa é de continuidade. “Eu acredito que seja o projeto mais duradouro de Ouro Preto e que a cidade pouco olha, ou que muito olha, mas quem deveria olhar, olha desviando o olhar”, brinca o fotógrafo Eduardo Tropia, presente desde a primeira edição.
A exposição pode ser visitada até 28 de setembro, de segunda a sábado, das 10h às 18h, e aos domingos, das 10h às 14h, no Salão de Exposições da Casa dos Contos, Rua São José, nº 12, Centro, Ouro Preto.


