Restauro do Prédio da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana

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No dia 12 de maio de 2020, foi concluído, pela Prefeitura Municipal de Mariana, o processo licitatório para o restauro do Prédio da Casa de Câmara e Cadeia. A empresa vencedora foi a A3 ATELIER DE ARTE APLICADA LTDA, a reforma custará quase dois milhões de reais, e será financiada pelo Governo Federal. Assim chega ao final um processo que se iniciou em 2011, com a elaboração do projeto de restauro de um dos mais importantes prédios do barroco mineiro. Agora é saber quando as obras se iniciam e qual será a destinação pública do prédio após o restauro.

O imponente edifício é um exemplo ímpar da arquitetura colonial brasileira e um marco na história administrativa de Minas Gerais.

Os documentos do Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Mariana (AHCMM) nos mostram que a construção se deu no local ocupado pelo Quartel dos Dragões da Vila de Nossa Senhora do Carmo (hoje Praça Minas Gerais). O quartel foi construído por ordenação do Rei Dom João V em 1719 e funcionou até 1744. O local escolhido era considerado nobre e digno de receber a construção de uma Casa de Câmara e Cadeia, sendo um dos pedaços de terra mais valiosos da recém-criada cidade de Mariana.

O projeto de construção da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana foi feito por José Pereira dos Santos, em 1762. A construção do edifício iniciou-se em 1768 e foi concluída em 1798, portanto foram gastos 30 anos para a conclusão da obra, que esteve sob a responsabilidade do mestre construtor José Pereira Arouca, um dos melhores e mais poderosos empreiteiros do século XVIII. Arouca executou e administrou várias obras relevantes como: igrejas, pontes, chafarizes, paredões, estradas e calçadas na cidade de Mariana e em várias Vilas do Ouro de Minas.

Era comum que os edifícios da Casa da Câmara e Cadeia, como o caso de Mariana, ficassem no centro da vila ou cidade, no largo do pelourinho, ou na praça principal. Os prédios continham, na maioria das vezes, dois pavimentos, várias salas e um plenário para reuniões dos vereadores e para julgamentos (sempre no segundo andar), sendo que no primeiro pavimento ficava a cadeia e a guarda.

A construção em nossa cidade, não fugiu ao padrão. Foi erguida em dois pavimentos e construída em alvenaria de pedra, desde a base até as cimalhas (saliências da parte mais alta da parede, onde assentam os beirais do telhado).

Em vários casos, as Casas de Câmara e Cadeia eram a única edificação pública na vila ou cidade, funcionando assim como símbolo do poder no período colonial.

Já no período imperial, as Casas de Câmara e Cadeia foram se esvaziando. Com a Constituição de 1824, a autoridade municipal perdia competências judiciais e de polícia, que foram repassadas para o Poder Provincial, fazendo com que as cidades ganhassem novos prédios públicos, como os fóruns e as delegacias de polícia. É importante acrescentar que várias Casas de Câmara e Cadeia passaram a se chamar Paço Municipal, abrigando simultaneamente o legislativo e o executivo.

No caso de Mariana, o prédio da Casa de Câmara e Cadeia é até hoje a Casa do Poder Legislativo Municipal, mas já abrigou a Prefeitura Municipal e a Cadeia Pública até o ano 1979.

O projeto de restauro iniciado em 2011, na administração do Presidente da Câmara Geraldo Sales, virou uma grande novela: tendo como atores principais, o Poder Federal, representado, a princípio, pelo programa MONUMENTA e depois pelo PAC – Cidades Históricas (Programa de Aceleração do Crescimento – Cidades Históricas) e, por outro lado, o Poder Municipal, executor da obra, representado pela Prefeitura Municipal de Mariana e Conselho Municipal de Patrimônio. Tudo isto supervisionado pelo IPHAN – Instituto de Patrimônio Histórico Nacional.

O Projeto de restauro e adequação foi coordenado pelo renomado Prof. Dr Leonardo Barci Castriota, do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais e desenvolvido por equipe multidisciplinar com profissionais de várias áreas do conhecimento. Em 2012, o projeto elaborado virou um livro chamado: CASA DE CÂMARA E CADEIA DE MARIANA – A recuperação de um patrimônio nacional.

Destaca-se no projeto, no meu ponto de vista, a tese de mestrado de Fernanda Trindade de Carvalho, denominada: Atores e valores: o processo de readequação do espaço físico da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana. Neste trabalho, um processo me chamou bastante atenção: Conhecer melhor o problema e entender a Câmara no imaginário da população. Saber o que a população pensa sobre o prédio e seu valor. Para isto, foram pesquisados grupos de pessoas que possuem, de alguma forma, relação com a Câmara de Mariana e foi buscado o aporte nas ciências sociais, através do estudo de métodos de pesquisas, que permitiram a leitura e compreensão dos valores atribuídos pela população à Câmara de Mariana

Participaram desta pesquisa alguns moradores do entorno do prédio, agentes do patrimônio, pessoas que freqüentemente acompanham as reuniões da Câmara e os grupos de turistas. Depois de entrevista, dinâmicas e processos de interação com os grupos, usando as mais diversas metodologias, as conclusões foram às seguintes:

– Comprovou-se que o prédio da Casa de Câmara e Cadeia é reconhecidamente um símbolo para a cidade, principalmente pela beleza arquitetônica da construção e testemunho da história de Minas Gerais, atribuindo-lhe também a função de ponto turístico.

– Descartou-se a transferir Câmara para outro endereço, como foi aventado no decorrer do processo. O prédio tem que abrigar a Câmara Municipal. Manter o uso atual do prédio da Câmara é manter viva a memória e a história desta instituição e da cidade

– Aprovou-se a ampliação da estrutura física da Câmara de forma que o valor simbólico seja mantido, conciliando os usos – local de trabalho e espaço turístico.

A proposta de restauro apresentada na tese de mestrado de Fernanda Trindade mostra uma direção para que a Câmara continue funcionando no mesmo endereço, avaliando que o edifício principal consegue continuar absorvendo algumas atividades da Câmara; o plenário atende às reuniões de menor porte, a sala do presidente e sua secretária, o que contribuirá para manter o caráter solene do prédio, além de conseguir manter algumas estruturas administrativas, como a assessoria jurídica próxima ao plenário, por exemplo.

O desafio e readequação do uso reúne três aspectos principais: ausência dos gabinetes dos vereadores; necessidade de ampliação do espaço para o apoio administrativo e espaço limitado do plenário para as reuniões mais concorridas. Somado a isso, temos a necessidade de melhoria no conforto básico e de garantir a acessibilidade.

Assim, o prédio da Câmara faz parte do cotidiano dos moradores de Mariana e, integra um conjunto arquitetônico que é um dos mais emblemáticos do período Colonial Mineiro. Cenário de atividades políticas importantes para Minas Gerais, palco de grandes decisões no passado e dos dias atuais, representa a alma de Minas e o sentimento de primazia dos marianenses.

Há a possibilidade de restauro do imóvel e transformá-lo em um espaço turístico e cultural, porém, com isso, esvaziaríamos seu principal significado: a vida de uma Câmara, como Casa do Povo e representação legal dos seus munícipes.

Entre todos os participantes, vereadores e funcionários, foi unanimidade o fato de que o atual prédio da Câmara não pode perder, pelo menos por completo, a função de abrigar o legislativo, uma vez que a Câmara de Mariana é a primeira Câmara de Minas Gerais e, dentre as Câmaras fundadas em 1711 – Mariana, Ouro Preto e Sabará – é a única ainda em funcionamento no primeiro prédio construído com o propósito de abrigá-la.

Nos pontos positivos destacados por esse grupo estão novamente a referência à beleza arquitetônica do conjunto, às festas religiosas e cívicas o reconhecimento como ponto turístico e como símbolo da história de Mariana. Nos pontos negativos apontados, o de maior destaque é a falta de manutenção dos monumentos, seguido do problema do trânsito de carros intenso na Rua Dom Silvério e Praça Minas Gerais.

No grupo das pessoas que freqüentam as reuniões da Câmara novamente, apareceu em destaque à beleza arquitetônica da Praça quando questionados sobre a representatividade do lugar.

Rua Dom Viçoso, 232 – Centro – Mariana/MG