- Mariana
Moradores de ocupações se manifestam por direito à moradia
Encontro na Arena Badaró reuniu moradores, advogados e lideranças para discutir ações de reintegração e cobrar diálogo com o poder público.
- Joyce Campolina
- Supervisão: Lui Pereira

No último sábado (5), a Arena Badaró, no Bairro Cabanas, foi palco da Concentração em Defesa do Direito à Moradia, um encontro que reuniu representantes de ocupações de Mariana, advogados, lideranças comunitárias e políticos locais para discutir os desdobramentos judiciais e políticos das ações de reintegração de posse que ameaçam milhares de famílias.
Iniciado com a oração do Pai Nosso para “abençoar o encontro”, o evento teve como objetivo informar a população sobre o andamento dos processos e organizar uma mobilização pacífica e unificada em defesa das comunidades. Durante a reunião, o líder comunitário José Maximiliano (Max) propôs que fosse realizada uma caminhada pacífica até a prefeitura, ideia prontamente apoiada pelos presentes, que ergueram as mãos em uníssono, como forma de mostrar que “as famílias não estão mortas esperando que tirem suas casas”. Ainda não há data para a manifestação.
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Além de representantes das comissões das ocupações e de grande parte dos moradores, o evento contou com a presença do vereador Preto do Cabanas, de Ricardo, assessor parlamentar dos deputados Leleco e Padre João, e dos advogados Thales e Moisés, responsáveis pela orientação jurídica da maior parte das famílias.

Ausência de prefeito foi sentida
Segundo os organizadores, todos os vereadores e o prefeito Juliano Duarte foram convidados para o encontro. A expectativa entre os presentes era clara, segundo a moradora Elizete, estavam todos esperando uma resposta do executivo e principalmente do Prefeito. “Nós estamos assim, na esperança que o prefeito Juliano venha, faça, fale alguma coisa”. E completa: “A população clama para o Juliano estar aqui pra dar resposta. Pede socorro. Mas sinceramente, eu não acho que ele venha”, desabafou.
Antes do início da conversa, marcada para às 10h, Max orientava o público que ainda se concentrava nas partes superiores da arena a se aproximar. Uma caixa de som que variava entre estilos mais animados e música gospel, ditava a atmosfera do encontro: uma mistura de apreensão e fé. “A expectativa nossa é que a gente tenha uma resposta positiva”, afirmou o pai e morador das ocupações José Acácio. “Até minhas crianças já ficam tensas, sabendo que a qualquer momento podem ter que sair de casa e ser jogadas na rua”, desabafou.

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A confiança dos votos
Mas, apesar das ameaças jurídicas de remoção, a confiança dos presentes se manteve firme, regida pela certeza do próprio peso político. “Porque, querendo ou não, a gente está falando do maior colégio eleitoral da cidade. Onze mil pessoas. Aqui elege um vereador, elege um prefeito. Só aqui elege”, afirmou José Arlindo, morador das ocupações.
Ao final da reunião, foi distribuído um formulário de cadastramento, para mapear cada moradia e orientar a defesa jurídica das famílias. O advogado Thales explicou: “Precisamos situar, em uma espécie de mapa, onde está a casa de cada um, porque o tratamento processual pode ser diferente. Montamos um checklist para conhecer o perfil de cada família, número de moradores, se as crianças estudam, se há acompanhamento em posto de saúde. Esses dados vão embasar a defesa de todos vocês”, disse.
As cópias do formulário também estão disponíveis no gabinete do vereador Preto do Cabanas, além de terem sido enviadas ao grupo de Whatsapp dos moradores.

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Desdobramentos e perspectivas jurídicas
Os advogados Thales e Moisés detalharam a situação das principais ocupações da Cidade Alta; Santa Clara, Santa Rita, Cristo, Serrinha e Renascer, explicando que há pelo menos dez ações de reintegração de posse em curso em Mariana, algumas em fases avançadas.
Segundo Thales, o caso de Santa Clara é o mais antigo e envolve divergência entre a área originalmente contestada e a hoje ocupada, já que o espaço antes ocupado não reflete a situação atual, que se encontra, completamente avançada. A defesa busca anular atos processuais que não garantiram ampla defesa, o que, se reconhecido, pode abrir caminho para usucapião.
Já a ocupação Santa Rita de Cássia vive situação mais delicada, pois há um acordo judicial em cumprimento de sentença que previa remoções. A esperança, no entanto, vem de um recurso de R$30 milhões do programa PAC das Encostas, articulado pelo deputado Padre João junto ao governo federal, para obras de contenção que eliminariam o risco geológico que justificou a decisão de demolição.
Sobre a situação do Santa Rita de Cássia, o advogado enfatizou a importância da população em se unir e cobrar o Poder Público. “Vocês têm que trabalhar aqui em conjunto, porque é dever e obrigações do prefeito e da Câmara Municipal receber as associações de moradores, recebendo essa comissão que aqui hoje foi formada para cobrar deles a execução dessa obra”, afirmou.

Situação na Vila Serrinha é frágil
Segundo os advogados, a situação da Vila Serrinha é tomada por uma maioria de moradores que possuem menos de cinco anos de ocupação, ainda não atendendo aos requisitos legais para pleitear a usucapião, o que dificulta a regularização imediata de suas moradias. Apesar disso, aqueles que residem no local há mais de um ano, sem contestação de posse, podem recorrer a ações judiciais de proteção possessória, buscando garantir o direito de permanecer na área.
O argumento central defendido busca uma solução que concilie o direito à propriedade com o direito fundamental à moradia, já que de um lado, tem-se a Companhia Mina da Passagem com vastas extensões de terras improdutivas, e de outro, uma comunidade que sobrevive às margens da falta de alternativa habitacional histórica de Mariana.

Durante o encontro, Max reforçou a gravidade da situação e que o objetivo da comissão é que nenhuma casa seja derrubada. “É para perder o sono mesmo, levantar da cama com vontade de militar e lutar pela sua casa. Lutar pela sua casa não é ser egoísta de defender só a sua não. Quando você está defendendo a casa de Paulo, a casa de Guilherme, você também está defendendo a sua!”, exclama o morador.
O encontro terminou por volta das 12h, com espaço de abertura para perguntas aos advogados presentes. Como fechamento, os representantes das ocupações reafirmaram o compromisso de manter o diálogo com o poder público e de buscar soluções legais e políticas conjuntas para garantir o direito à moradia, previsto no artigo 6º da Constituição Federal.
