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Hoje é terça-feira, 23 de setembro de 2025

“Vozes Femininas – Do Silêncio ao Grito” visitou Ouro Preto

Ação artística que acolhe mulheres vítimas de violência contou com apresentação artística de cinco cantoras de diferentes áreas musicais

Déa, Irene, Iza, Isaddora e Júlia apresentaram o projeto Vozes Femininas - Do Silêncio ao Grito
Déa, Irene, Iza, Isaddora e Júlia apresentaram o projeto Vozes Femininas - Do Silêncio ao Grito – Foto: Ana Beatriz Justino/Agência Primaz

Na tarde do último sábado (20), a cidade de Ouro Preto recebeu o projeto Vozes Femininas – Do Silêncio ao Grito, realizado no Paço da Misericórdia. A iniciativa contou com a apresentação artística de cinco mulheres, Déa Trancoso, Irene Bertachini, Iza Sabino, Isaddora e Júlia Tizumba, já que a artista Coral não estava presente. O projeto é realizado pelo Viaduto das Artes a partir de uma emenda parlamentar da deputada federal Duda Salabert, e cria um ambiente de acolhimento para mulheres cis e trans em situação de violência. O Vozes Femininas une arte e escuta, percorreu sete cidades de Minas Gerais, e finalizou a turnê no Paço da Misericórdia. No dia 31 de outubro o projeto fará a última apresentação, que será na capital mineira, quando o repertório vai ser expandido.

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As dinâmicas de acolhimento

A apresentação utiliza a arte como forma de acolhimento, intercalando dinâmicas com apresentações de músicas autorais das artistas presentes. Logo após a entrada, Déa Trancoso se posicionou à frente do palco, falou sobre espiritualidade e colocou as participantes para realizarem um exercício de respiração com raízes ancestrais enquanto a artista tocava uma flauta e cantava. A meditação, como ressaltou a cantora, reafirma nossa presença na Terra.

As mulheres presentes fizeram o exercício de olhos fechados enquanto faziam um “ioiô imaginativo”, partindo do lugar de nascimento e subindo até observar de longe o planeta Terra.

Cantando e tocando flauta, Déa Trancoso estimula a experiência sensorial das mulheres presentes no evento, despertando as vozes femininas
Cantando e tocando flauta, Déa Trancoso estimula a experiência sensorial das mulheres presentes no evento – Foto: Ana Beatriz Justino/Agência Primaz

A partir dessa dinâmica já se cria conexão entre as pessoas presentes, mas a dinâmica mais divertida foi a dos ecos, iniciada no palco, com palavras proferidas pelas cantoras. As palavras vão ecoando pela sala, enquanto mais palavras e vozes se juntam ao chamado coral. Entre as palavras leveza, fome de vida, amor, força, acordar, perseverança a energia do espaço vibrou, cheio de conexão e trocas.

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Relatos compartilhados

Depois das palavras ecoadas, teve início um momento de dividir a história de luta e superação entre as mulheres presentes. As falas transpassaram casos de violência doméstica, abuso, mas também de superação e de luta. As artistas também compartilharam relatos, como quando Isaddora confidenciou aos presentes que se libertou de um ambiente abusivo apenas com a roupa do corpo e seu microfone. Assim, o projeto nasceu, acreditando na arte como lugar de acolhimento e força, utilizado para ter coragem e para reagir.

Entre as confidências foram relatados casos de violência psicológica, que podem ser observados quando o parceiro ou parceira faz ameaças, ridiculariza, constrange, humilha ou controla o que você veste. Segundo os dados da pesquisa “Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil”, 37,5% das mulheres que responderam à pesquisa passaram por situação de violência. E 31,4% dessas mulheres passaram por situações que podem ser consideradas como violência psicológica.

Depois da troca intensa de relatos, as artistas declamaram poemas e cantaram. composições que falam de luta, coragem, identidade e liberdade. O repertório é completamente autoral e possui músicas inéditas, mas duas composições apresentadas são de outros artistas. A música “Germinar”, da cantora Flaira e “Maria Maria”, de Milton Nascimento, composição responsável por dar o fechamento da experiência. 

O repertório, segundo Déa, foi pensado pelas artistas de forma orgânica e em acordo com o público-alvo das ações. “Canções que falassem desse caos humano, mas com alguma solução”, destacou a cantora, formando um repertório potente e carregado de significados.

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Organização que acolhe

Durante toda a ação esteve presente uma intérprete de libras e uma pessoa responsável pela recreação das crianças, já que a iniciativa entende que nem todas as mulheres presentes têm rede de apoio. Para além disso, a diretora administrativa do Viaduto das Artes, Josiane Amâncio, contou que a escolha das cidades foi pensada a partir de níveis de violência e localização geográfica. “Foi feito um estudo para saber onde tinha o maior número de violência que a gente consegue fazer através de denúncias. Então, às vezes você vai ter algum município que tem um número muito mais alto, mas não é denunciado, então a gente não consegue fazer esse levantamento”.

Para a coordenadora executiva Ayobami Nombulelo, o Vozes Femininas é uma potência de acolhimento feminino. “Essa comunhão do que é ser mulher na amplitude da palavra, independente do corpo que você ocupa. Se é um corpo gordo, se é um corpo preto, se é um corpo trans, é o que é ser mulher e o que a gente tem em comum, que são as violências que a gente sofre”, ressaltou.

A iniciativa, para a artista Déa Trancoso, é muito além de arte, é política e social, podendo ser ainda considerado um projeto de excelência artística. “Ele também está atendendo um recorte de mulheres em situação de violência doméstica, que é uma coisa que tem muito no Brasil”, destacou Déa.

A iniciativa vai lançar um documentário sobre o projeto “Vozes Femininas – Do Silêncio ao Grito”, comporto por imagens registradas em todas as cidades que o evento percorreu, com previsão de disponibilização em novembro. Por ser mobilizado por uma emenda parlamentar, não se tem certeza de que o projeto vai ter novas apresentações, mas existe a esperança de que seja possível que ele rode por mais cidades.

Proteção à mulher

Existem leis que protegem as mulheres de situações de violência doméstica, como é o caso da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que presta assistência e proteção às vítimas; e a Lei do Feminicídio (Lei 14.994/2024), para casos de assassinatos cometidos em função do gênero, recomendando-se que todas as situações, envolvendo qualquer tipo de violência doméstica, seja denunciado via Centro de Atendimento à Mulher, que funciona 24 horas; pelo número 180; ou pelo canal do Whatsapp (61) 9610-0180. Em Ouro Preto existe a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, cujo telefone é (31) 97595-3335. Em Mariana foi recentemente inaugurado, o Núcleo de Atendimento à Mulher, que funciona no prédio da Delegacia de Polícia Civil, localizada na Av. Getúlio Vargas, no prédio do antigo fórum.

Foto de Ana Beatriz Justino
Graduanda em jornalismo pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e estagiária na Agência Primaz. Possui grande atração por gênero, cultura e politica.