- Minas Gerais
CEO da Cemig teria desviado verba pública para gastos de luxo
Deputados denunciam uso irregular de cartão corporativo, viagens opulentas e mecanismos irregulares de blindagem a executivos; MPMG é acionado para investigar

O presidente da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Reynaldo Passanezi Filho, está no centro de uma denúncia formalizada pelo deputado estadual Leleco Pimentel (PT) e pelo deputado federal Padre João (PT-MG) junto à Procuradoria Geral do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) na última quarta-feira (23). Os parlamentares afirmam que o executivo cometeu uma série de irregularidades envolvendo o uso de recursos públicos para fins pessoais, além de estruturar, dentro da empresa, um sistema de blindagem institucional que impede sua responsabilização e da cúpula da estatal, mesmo em casos de possível ilegalidade.
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Gastos pessoais com verba pública
As denúncias têm como base documentos encaminhados aos parlamentares por integrantes do alto escalão da própria estatal. Segundo as informações, o presidente da Cemig teria utilizado o cartão corporativo da empresa para bancar despesas que vão desde assinaturas de serviços de streaming, como Amazon Prime, até o consumo de bebidas alcoólicas, refeições durante fins de semana e uma viagem a um parque aquático em Cancún, o que é vedado pelas regras do cartão corporativo.
Os registros apontam que, entre janeiro de 2020 e outubro de 2021, os gastos somaram R$114.738,60. Desse montante, apenas R$17.581,25 foram reembolsados, valor definido pelo próprio executivo, sem qualquer auditoria externa, contrariando as normas de transparência e fiscalização.
O deputado Leleco Pimentel considera o caso emblemático de uma cultura de privilégio dentro da gestão pública. “Não se trata apenas de má gestão. É a institucionalização do privilégio e da irresponsabilidade. Minas não pode aceitar que a presidência de uma estatal se torne um trampolim para luxo pessoal”, afirmou.
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Viagem de luxo em Cancún com recursos da estatal
Outro ponto da denúncia que chama atenção diz respeito a uma viagem realizada pelo presidente da Cemig ao resort Paradisus Cancún, no México, em janeiro de 2023. A justificativa oficial da viagem seria a participação em uma conferência internacional promovida pelo banco Santander. No entanto, segundo os parlamentares, a estadia no resort teria incluído um upgrade de acomodação, extensão da viagem e a presença de cônjuge do executivo.
Parte dos custos foi coberta com recursos da própria Cemig (cerca de 800 dólares) , enquanto o restante teria sido pago por um banco estrangeiro vinculado à estatal na Bolsa de Nova York. Os deputados pedem que o Ministério Público investigue a real origem dos recursos utilizados e se houve duplicidade de financiamento.
Carta Conforto garante impunidade a executivos
A denúncia também questiona a legalidade de um instrumento interno conhecido como “Carta Conforto”, que garante à alta gestão da empresa a indenização automática de despesas com processos judiciais e administrativos, inclusive em casos criminais.
De acordo com a representação, esse mecanismo foi implantado sem aprovação formal pelos órgãos competentes da companhia e sem qualquer limite financeiro, o que contraria normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pareceres técnicos da área de compliance da própria Cemig. O documento aponta ainda que uma gerente da área foi exonerada após se manifestar contra a legalidade da carta.
Para o deputado Padre João, o dispositivo evidencia uma postura institucional conivente com possíveis ilegalidades. “Blindar gestores contra as consequências de seus atos não é política de compliance, é cumplicidade institucional com desvios”, criticou.
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Compliance da estatal sob suspeita
A denúncia inclui ainda um episódio em que uma empresa de media training, Olga Curado, teria recusado assinar contrato com a Cemig alegando que o sistema de integridade da estatal seria menos rigoroso que o seu próprio. O contrato só foi firmado após a empresa exigir adequações às normas legais. Para os parlamentares, o caso simboliza a fragilidade institucional que impera dentro da gestão da companhia.
Outro elemento que preocupa os autores da denúncia é o conteúdo de uma apresentação institucional da Cemig ao mercado financeiro, que, segundo os deputados, sugeria a privatização da empresa como uma forma de “reduzir o excesso de órgãos de controle e fiscalização”. Para Leleco, tal afirmação revela um projeto de gestão que enxerga a fiscalização como obstáculo. “O controle é uma conquista da democracia. A tentativa de desmontar a fiscalização precisa ser investigada com rigor”, defendeu o parlamentar.
Pedido de investigação e responsabilização criminal
Diante da gravidade das informações, os deputados solicitaram ao Ministério Público a abertura de inquérito criminal, a realização de auditoria detalhada dos gastos com cartões corporativos e uma apuração sobre a legalidade das Cartas de Conforto. Os deputados também pedem o encaminhamento da denúncia à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), ao Tribunal de Contas do Estado e à Controladoria-Geral da União.
A representação formal sugere que, além de improbidade administrativa, podem ter sido cometidos crimes como peculato, fraude à lei e uso indevido de recursos públicos. Os parlamentares pedem que, se confirmadas as irregularidades, haja responsabilização civil, administrativa e criminal, com possível bloqueio de bens e devolução dos valores aos cofres da Cemig. “A Cemig é patrimônio do povo mineiro e deve servir ao interesse público, não a projetos pessoais nem a interesses de mercado”, concluiu o deputado Leleco Pimentel.
Sucatear para privatizar
Em Mariana, desde o início de 2024 não existe mais o escritório de atendimento próprio da Cemig. De lá pra cá, o endereço de atendimento aos cidadãos já mudou três vezes, sempre no interior de algum ponto comercial da cidade. Atualmente o atendimento acontece dentro de uma papelaria próxima do Jardim, o espaço é pequeno e a fila de atendimento não raramente toma a calçada da loja.
No relatório da CPI da Cemig, realizada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais entre 2021 e 2022, o relator, deputado estadual Sávio Souza Cruz (MDB) afirmou ser uma estratégia da empresa e de seu diretor presidente “sucatear para privatizar”, pois, através da piora dos serviços, a população ficaria mais inclinada em aceitar o desmonte da empresa.
Em entrevista recente para a Agência Primaz, o deputado Leleco Pimentel explicou ainda uma outra estratégia de privatização: a venda dos ativos da companhia à iniciativa privada e o esvaziamento de sua importância estratégica. Ao questionar a venda de hidrelétricas viabilizada pelo governo Zema, o deputado fez a seguinte comparação: “Se você tem um carro e vende o motor, vende a roda, vende a caixa de marchas e o volante, no final você tem um carro? A Cemig sem gerar energia elétrica e sem cabos de transmissão não é a Cemig”.
A reportagem procurou a assessoria da Cemig para esclarecimentos, mas até o fechamento desta reportagem não obteve qualquer retorno.