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Hoje é domingo, 19 de maio de 2024

Obra audiovisual sobre saudade traz bairro Santo Antônio à cena

Curtíssimo-metragem esteve em exibição na 2ª edição da mostra online “Meu Cinema, Nosso Território”

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Capa do curtíssimo-metragem produzido por Uriel Silva - Foto: Uriel Silva
“Eu vou tá em Miami pensando em Prainha”, afirma Antônio Wellington Pereira, personagem principal do curtíssimo-metragem “O que é saudade?”. A obra do estudante de Jornalismo, Uriel Silva, esteve em exibição na 2ª edição da mostra online da residência artística “Meu Cinema, Nosso Território”. Com a temática pautando os Direitos Humanos, a mostra trouxe filmes que, em um recorte sensível, apresentam como esses direitos estão sendo exercidos no território de cada diretor e diretora.

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Em seu filme, Uriel traz à cena o primeiro bairro de Mariana, o Santo Antônio, mais conhecido como Prainha. É nesse bairro que está situada a Capela Bandeirantes de Nossa Senhora do Carmo, primeira igreja do município. Apesar de ser o berço da Primaz de Minas, a Prainha não recebe a visibilidade e valorização que merece.   “É tratado com esse desdém, né? Você percebe que a cidade em si não gosta muito do bairro por conta de ser uma zona periférica, pela maioria das pessoas que estão ali são pretas, que são resistentes do local. E aí que acaba que o bairro acaba sendo esquecido, sendo que ele tem uma importância gigantesca cultural e histórica. É histórico o que tem ali, porque foi dali que a cidade surgiu, nasceu”, aponta Uriel em entrevista à Agência Primaz.

O curtíssimo-metragem explora, em 1 minuto, o sentimento de saudade e as lembranças que envolvem esta região. Segundo o diretor, mostrar o Santo Antônio também é mostrar o amor que os moradores têm pelo próprio bairro. “As pessoas ali realmente sentem como se o bairro fosse território deles e é território deles. Tem uma frase, que tem num muro, aqui da cidade, que fala que o patrimônio é da humanidade, mas não da comunidade. E lá é diferente, lá é da comunidade”.

O sentimento de saudade já causava inquietações em Uriel. Em uma conversa com Wellington, personagem principal da narrativa, surgiu o questionamento que dá nome ao filme: “O que é saudade?”. “Porque eu acho uma pergunta muito mais importante do que impor uma resposta, e eu gosto de trazer isso. Eu perguntei pra ele o que era saudade. O que era esse fundamento de sentimento dele. O que seria esse sentimento pra ele?”, relata.

Como resposta, recebeu uma perspectiva sensível e sincera. “E o mais legal que foi uma resposta que pode parecer genérica, mas no geral não é. Uma resposta que vem do coração. É uma resposta que ele trouxe de uma forma muito carinhosa, principalmente porque estava passando por um momento complicado no momento do contexto do vídeo.”

Inicialmente, o objetivo do filme era conversar com garimpeiros da região e produzir um audiovisual sobre o garimpo. Diversas pessoas do bairro Santo Antônio eram garimpeiros, inclusive o pai do diretor. O rio Ribeirão do Carmo, localizado nas proximidades do bairro, era foco do garimpo no século XVI devido à quantidade de ouro. “Meu pai já foi garimpeiro. Então, eu tenho essa curiosidade, mas acabou que eu fui encontrar o pai do Wandrey [Wellington] na casa dele, porque eu já sou bem próximo da família dele. Então fui lá encontrei a mãe dele, o pai dele, e o pai dele topou gravar uma entrevista comigo.

Foi a partir desta troca de ideias que o rumo do projeto tomou outros caminhos. “O papo foi muito legal, foi muito gratificante a conversa. E aí, acabou que sucedeu, né? Deu certo essa conversa e foi indo até chegar ao tópico principal do filme, que é a pergunta. E aconteceu, foi isso, foi bem tranquilo, foi bem natural essa entrevista que eu fiz com ele”, relembra Uriel.

Ao pensar em saudade, o curtíssimo-metragem também experimenta a estética da memória ao trazer um filme em preto e branco e na vertical. “Eu falo de memória afetiva, fotografia, memória antiga, foto, por isso o preto e branco, pra remeter essas fotos antigas, por isso o granulado, para remeter novamente essas fotos antigas que não tem uma definição ali tão boa, né? Tudo é interpretativo.”, explica.

De acordo com Uriel, a verticalização do produto audiovisual também surge para representar a ideia de uma nova memória. “Hoje as pessoas não levam fotografias no bolso como antigamente. Nem foto três por quatro as pessoas tem mais na carteira, mas elas levam todas as lembranças no celular. Tanto que eu estou usando ele pra conversar agora. Tem foto da minha mãe, tem foto do meu tio avô, tem foto de gente que eu me importo no meu celular. Momentos importantes”.

Uriel retrata o celular como um moderno álbum de fotografias ou um novo espaço para guardar memórias afetivas. “E por isso na vertical. Pra ele mostrar que o celular tem esse poder, né? Não só o celular como diversas outras questões podem trazer essa memória afetiva, mas o celular traz muito mais afinco, porque ele é usado o tempo todo, e mesmo que se tornando banal a questão das pessoas tirarem fotos da família, selfie em si, ainda sim, é um exercício da memória”, completa.

A Mostra “Meu Cinema, Nosso Território” foi composta por 14 curtíssimos desenvolvidos durante os 3 meses de residência. Com foco em alunos e profissionais do norte e noroeste de Minas Gerais, entre os selecionados havia residentes de Januária, Montes Claros, Belo Horizonte e Mariana. Sobre fazer audiovisual em Mariana, Uriel Silva já desenvolveu diversos produtos explorando este cenário. “O lugar que você vive, o lugar que você nasceu, o lugar que você é familiarizado, vai se tornar um objeto, independente do tipo de arte que você desenvolva, sendo artes plásticas, música, fotografia, cinema…”.

Para Uriel, Mariana e suas narrativas são inspiração e objeto de estudo. É sobre contar histórias a partir das próprias vivências. “Nasci aqui, minha família veio dessa região aqui, Bento Rodrigues, Ribeirão do Carmo, e esses locais que eu fui criado sempre vão ser os objetos principais nas minhas obras porque são os lugares que eu sou familiarizado. Querendo ou não, qualquer história que eu for fazer, vai ser muito mais fácil desenvolver um roteiro a partir de um lugar que eu tenho um ponto em comum. Meu ponto comum é Mariana. Então as histórias que eu desenvolvo, se não falam da minha família, falam do lugar que eu vivo”, finaliza.

Com o fim da mostra, em breve “O que é saudade?” estará disponível online novamente. O próximo passo é lançar a obra em festivais de micro-curtas.

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